desenho, vigilância, corpo
Sobre Firmino, sabemos que foi artista, aluno de Escultura na Academia Portuense de Belas Artes; modelo de António Soares dos Reis – seu colega – na Aula do Nu; e porteiro do Museu Portuense, o antecessor do museu homónimo do autor de Firmino. E é a esta sua tripla condição que se referencia “desenho, vigilância, corpo” de Sílvia Pinto Costa.
A proposta para o Afinidades, parte de uma evocação a estas três intrincadas notas biográficas, que são tecidas com uma segunda superfície de ligações devolvidas ao seu autor António Soares dos Reis.
A camada de organza remete-nos para a ideia suporte, enquanto estrutura material e base para o desenho convocado pela linha de silhueta que delimita e sustenta os elementos, como que um esboço, método partilhado por todos os criativos e criadores. Mas a organza é também transparente, desafiando a vontade de supressão do próprio suporte. É esta proposta também um esboço (de proposta, e proposta acabada em si), como os desenhos preparatórios de Soares dos Reis para o busto de Firmino.
Este esboço material, volumétrico, enquadra, organiza e delimita os três elementos. A mão parece segurar uma mesma ferramenta de desenho, partilhada por Firmino (o modelo, o também artista) e Soares dos Reis (o autor); o olho traduz a vigilância do porteiro que guarda e controla, mas também orienta, que usa este posto profissional temporário como uma outra entrada, antecipada, no espaço museológico – onde hoje se encontra – mas também o mesmo olho do escultor, de qualquer artista que quer ver; a clavícula, parte do corpo, torção do pescoço, característica imanente do modelo, e pormenor, subtileza estilística do autor que lhe permitiu vencer o concurso para uma bolsa artística.
A integração dos três temas – e as suas subcamadas – faz-se através de um colar, peça de eleição de Sílvia Pinto Costa, enquanto um outro espaço-cenário de exposição (ou apenas preparação), que transporta o esboço para fora do museu – ou o museu para fora do museu. No Renascimento, a palavra “museu”, enquanto lugar de coleções, não se referia apenas a uma condição espacial (como um study, uma biblioteca, um jardim), mas também a lugares onde as ideias podem ser arquivadas (uma enciclopédia, um jornal). Qual é então o papel de uma joia, usável, ostentável, vestível, enquanto “museu”?
Faiança e Organza
260 x 200 x 20 mm
English
drawing, vigilance, body
We know that Firmino was an artist, a Sculpture student at the Porto Academy of Fine Arts, a model for António Soares dos Reis—his colleague—in the Life Drawing Class, and a doorman at the Museu Portuense, the predecessor of the eponymous Museum of Firmino’s author. It is to this triple condition that the “desenho, vigilância, corpo” (drawing, vigilance, body) by Sílvia Pinto Costa refers to.
The proposal for Afinidades is based on evoking these three intertwined biographical notes, which are woven with a second level of connections related to its author, António Soares dos Reis.
The layer of organza leads us to the idea of support as a material structure and a base for the drawing invoked by the silhouette line that outlines and maintains the elements, like a sketch, a method shared by all creatives and creators. But the organza is also transparent, challenging the desire to suppress the support. This proposal is also a sketch (of a proposal and a finished proposal), like the preparatory drawings by Soares dos Reis for Firmino’s bust.
This material, volumetric sketch, frames, organises and bounds the three elements. The hand seems to hold the same drawing tool shared by Firmino (the model, the artist) and Soares dos Reis (the author); the eye translates the vigilance of the doorman who guards and controls but also guides, using this temporary professional position as another, anticipated, entry into the museum space – where it is now located – but also the same eye of the sculptor, of any artist who wants to see; the clavicle, part of the body, the twist of the neck, an inherent characteristic of the model, and detail, stylistic subtlety of the author that allowed him to win the competition for an artistic scholarship.
The integration of the three themes – and their sublayers – is achieved through a necklace, Sílvia Pinto Costa’s piece of choice, as another exhibition space-scenario (or just preparation), which takes the sketch out of the museum – or the museum out of the museum. In the Renaissance, the word “museum,” as a place for collections, did not refer only to a spatial condition (like a study, a library, a garden) but also to places where ideas can be archived (an encyclopaedia, a newspaper). Then, what is the role of a wearable, ostentatious, dressable jewel as “museum”?
Earthenware and Organza
260 x 200 x 20mm
Créditos Fotografias | Photography Credits: Sílvia Pinto Costa
Sílvia Pinto Costa
Sílvia Pinto Costa (Lisboa, 1983) é Artista Plástica pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto.
Em 2013 co-fundou a SCAR-ID, uma loja-galeria de design português de autor, onde é curadora, e em 2017 a ATER by scar-id, uma marca que explora o design de objectos, cerâmica, acessórios e moda.
Em 2019, Sílvia começou a desenhar e produzir linhas de cerâmica para a sua marca ATER, onde explora um certo exagero tipológico e formal e desafia a noção de equilíbrio.
Em 2022, expõe na Exposição Colectiva 1000 Vases em Paris.
Lecciona Fotografia, História de Arte e Design.
English
Sílvia Pinto Costa (Lisboa, 1983) is a Visual Artist from the Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto.
In 2013, she co-founded SCAR-ID, a design and art store galley; in 2017, she founded ATER by Scar-ID, a brand that explores the design of objects, ceramics, accessories, and fashion.
In 2019, she began designing and producing ceramic lines for her brand ATER, where she explores a certain typological and formal exaggeration and challenges the notion of balance.
In 2022, she exhibited at the 1000 Vases Exhibition in Paris.
Sílvia teaches Photography, Art History and Design.